Parte das multas da Telefônica fica de fora de acordo com Anatel

Rafael Bitencourt – Valor Econômico

A demora em assinar o acordo de troca de multas da Telefônica por novos investimentos já produz seus primeiros efeitos negativos. Mais de 20% do valor das penalidades devem ser excluídos da negociação por risco de prescrição dos processos paralisados há quase três anos na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

As sanções negociadas somam R$ 3,081 bilhões, atualizados em janeiro. Os valores a serem excluídos do acordo correspondem a R$ 651 milhões, equivalentes a 21,12% do total. A retirada de multas deve esvaziar, na mesma proporção, os investimentos anunciados de cerca de R$ 5 bilhões.

A Anatel tenta há quatro anos celebrar seu primeiro Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o setor. O acordo permite que penalidades pesadas sejam convertidas em investimentos, com montantes ainda maiores. Os recursos devem ser direcionados à oferta de nova infraestrutura em localidades que não garantem retorno financeiro imediato.

As primeiras tentativas de celebração de TACs, duas com a Oi e uma com a Sercomtel, fracassaram diante da dificuldade financeira das prestadoras. A Oi enfenta um processo de recuperação judicial complicado e a Sercomtel, um processo de caducidade de sua concessão.

Em 2018 completa três anos que a proposta de TAC foi acertada entre a área técnica da Anatel e a Telefônica. O comando da agência chegou a aprovar o TAC e o enviou ao Tribunal de Contas da União (TCU), que pediu ajustes para que o acordo fosse assinado. As multas selecionadas até aquele momento tiveram a sua tramitação interrompida. Agora, a agência tem até 29 de abril para evitar que parte dos processos sancionatórios expire, seja com a assinatura do TAC ou com a retomada do trâmite interno.

Para evitar que a operadora seja premiada com a isenção no pagamento das sanções, os processos com risco de prescrição terão o curso de análise processual retomado. O presidente da agência, Juarez Quadros, disse ao Valor que essas multas com previsão de serem excluídas do acordo já foram distribuídas aos diretores.

“Observados os prazos prescricionais, ninguém vai reter processo nos gabinetes. E, ao serem apreciados e negados os recursos, automaticamente serão retirados do TAC”, diz Quadros, reforçando que se trata de procedimento padrão, aplicado a qualquer operadora.

O principal problema de prescrição, no caso da Telefônica, envolve as sanções em estágio mais avançado, em que a próxima etapa é o julgamento de recurso pela diretoria da Anatel. Isso significa que os processos já estarão na segunda instância administrativa, o que impede de serem incluídos em TAC. Esgotada a possibilidade de recursos nessa fase, os valores são enviados à cobrança judicial.

A tele conta ainda com outro conjunto de multas em primeira instância que vence até abril. Nesse caso, as sanções têm valores estimados, ainda em fase de instrução nas superintendências, e podem ser devolvidas ao TAC.

Segundo Quadros, os processos com risco de prescrição e exclusão do acordo serão julgados pela diretoria até abril. “À medida que os gabinetes forem terminando a análise, os conselheiros vão começar a pautar”, afirmou.

A hipótese de celebração do acordo com a Telefônica antes de abril já é descartada. A agência precisa cumprir procedimentos internos para fazer os ajustes finais determinados pelo TCU. A minuta do termo de ajustamento de conduta está na Procuradoria Federal Especializada, área jurídica da agência vinculada à Advocacia-Geral da União (AGU). Só em meados de fevereiro os procuradores federais deverão concluir a análise.

A etapa seguinte é a de nova verificação pela área técnica para, em seguida, submeter à diretoria. Isso envolve o rito de sorteio do relator para o caso e a votação pelo comando da agência.

O TCU precisará dar uma nova posição à celebração do TAC. “Nada será assinado sem antes ser apreciado na Procuradoria, na área técnica, no conselho e ter voltado do tribunal”, disse Quadros.

A preocupação com o vencimento dos processos de multas não é à toa. Caso isso ocorra, a corregedoria da Anatel pode abrir um processo interno para identificar e punir os responsáveis. “Não há a mínima possibilidade de qualquer multa prescrever”, afirmou ao Valor outro integrante da diretoria da agência, Leonardo de Morais. Procurada, a Telefônica informou que “acredita que a decisão final ocorrerá antes do prazo de prescrição, seguindo a transparência que o processo exige”. A operadora ressaltou a importância do TAC para ampliar o acesso à internet de alta velocidade a mais de 5 milhões de domicílios. “A sociedade brasileira será a grande beneficiária da sua aprovação”, diz tele.

Morais informou que a Anatel monitora rigorosamente os prazos de prescrição nos quatro TACs negociados, que somam R$ 4,039 bilhões em multas. Esse valor abrange as sanções dos grupos Telefônica (R$ 3,081 bilhões), Claro (R$ 501 milhões), TIM (R$ 406 milhões) e Algar (R$ 51 milhões).